quarta-feira, 20 de junho de 2012

inferno nº 5


Seria sob uma luminosidade meio fosca, meio perdida no tempo. Uma luz meio vaga. Teria Johnny Cash ao fundo, com sua voz de consciência inacabada, sua palavra de senilidade sincera e verdadeira. Se minha vida fosse um filme, o roteirista não seria eu. Se minha vida fosse um filme, não passaria nos cinemas. Seria daqueles filmes que você acha perdido em meio a um milhão de filmes antigos, num daqueles links que você deixa passar. Se minha vida fosse um livro, não teria título. Uma história de uma página, cíclica. Uma história daquelas que você abre numa página aleatória quando não tem nada para fazer.

O dia está nublado. As pessoas usam casacos na rua, na escola e em todos os lugares. Eu não tenho uma casaco. Quase nunca estou com frio. O céu está lindo. É a coisa mais branca que eu consigo ver. É lindo esse céu. O pôr do sol é totalmente diferente do nascer dele. No nascimento, está tudo escuro e o sol vai abrindo caminhos com os cotovelos, empurrando as sombras para lá e para cá. Doendo nos olhos. Chorando nas praias. Quanto mais tempo vai se passando, mais luz o sol vai lançando sobre nós. Mais alto e imponente ele fica. No poente, está claro, e ele vai para a escuridão, nascer em algum outro lugar do mundo. Ele só vai. A noite aparece e permanece estática.

A câmera foca em meu rosto. Eu ando pelos cantos dos corredores.

A professora sorri para mim quando eu entrego o trabalho. Não é o que ela espera de mim. Gosto de surpreender as pessoas. Eu sou muito mais do que um maluco sentado na última cadeira da última fila. Sou muito mais do que o maluco que foi expulso das aulas de artes. Sou muito mais do que o maluco que disse na cara da coordenadora que a arte não tinha utilidade nenhuma e que havia coisas muito mais importantes, mesmo sendo, provavelmente, o maior adorador de arte daquela escola medíocre. Eu sou muito mais do que o revoltado de cabelo bagunçado. Existe um cara sentimental por trás das teorias sobre o universo. As pessoas costumam chamar de “cara gay”, mas eu prefiro chamar de “eu”.

É assim que eu sou. Eu tenho namorada. Me orgulho muito em não me comportar como um homem comum. Eu tento disfarçar quando olho para a bunda de uma garota. Imagina que constrangedor! Sei lá. Os homens normais não têm bom senso. Eu realmente não sou um homem normal. E não é questão de sexualidade. É questão de caráter e moral.

Estou sentado no chão com um livro de autoajuda, que não é meu, no colo. Do meu lado está uma menina que há algumas semanas costumava ter o cabelo loiro e que me apareceu assim, morena, depois de um longo período sem vê-la.

É a pessoa mais educada que eu conheço. Uma vez ela estava brincando com uma garrafa de água de plástico na mesa da cantina. A garrafa caiu com certa força na mesa. Acredite ou não: ELA PEDIU DESCULPAS PARA A MESA!

Ela está lendo “A dança do universo – Marcelo Gleiser ”. Ela disse que vai me emprestar depois que acabar. Eu sentei e não falei nada. Ela também não. EU fiquei olhando para o céu e enfatizando na minha cabeça o quanto ele estava lindo. Eu em voz baixa. Ela falou que também gostava quando ele ficava assim. Eu falei que estava muito branco. Ela disse que aquilo não era branco. Eu disse que era a coisa mais branca que eu já havia visto. Ela voltou a ler o livro. A gente conversou sobre a irmã dela. Depois eu disse que as pessoas diriam que eu estava gostando dela, somente por estar ali, conversando com ela. Ela sorriu e confirmou. Eu falei sobre amigos. Ela disse que contava nos dedos de uma mão as pessoas que poderia contar e que quando realmente precisava, percebia que nem aquelas pessoas ela poderia realmente contar. Ela disse para eu aprender. Acho que aprendi.

Johnny Cash, um filho da puta que sabe fazer os outros chorarem.

“Eu sou o cara mais louco que vocês já conheceram” - João Neto Guimarães

Eu espero que as pessoas não leiam isso. Pelo menos as pessoas envolvidas.

Hoje eu tirei umas fotos. Estava precisando conversar com alguém. Precisava que alguém perguntasse se eu estou bem. Precisava que alguém realmente estivesse preocupado com a minha resposta. Faz uns dois dias que não vejo a confidente/conselheira. Faz um mês que não vejo minha melhor amiga. Liguei para quem eu ligo quando preciso e a única pessoa que eu conto nesses dias nublados. Acho que ela está me evitando. Eu sempre estrago as coisas. Eu sou o remédio amargo que a criança renega.

Eu realmente precisava falar com ela. A louca dos guturais se foi, apesar de ter deixado uma sósia muito parecida na Noruega com a qual faz muito tempo que eu não converso. Tudo bem. Peguei o violão e tentei algo. Deu pra consolar os mosquitos. Assisti algumas coisas no computador. Eu preciso passar no vestibular. Preciso ir bem no ENEM. Preciso de um monte de coisa, mas eu nem consegui falar com minha melhor amiga. Nem consegui conversar com alguém direito hoje. Ainda não consegui sair dessa fase adolescente em que por tudo se faz drama. Consegui passar das seis mil visitas no blog, mas que se foda.

O Sr. Reticente é o cara mais fantástico que eu não conheci.

Eu tenho um romance para terminar. Tenho que acordar às seis da manhã e tomar banho gelado. Tenho uma porra de uma prova com 45 questões de Matemática e suas ciências amanhã às oito. Tenho um mundo pra construir. Vamos ver se eu consigo falar com Maria amanhã. Só falar besteira. Ela me distrai. Vou ver se me encontro comigo. No calçadão de Ponta Negra às sete, que tal?

Vou esperar o carnaval chegar. Quando esse escarcéu passar. Estou me guardando para quando o carnaval chegar. Quem me vê em minha loucura matinal acha que eu não sei sambar. Eu ainda tenho um mundo cheio de desilusões à minha frente, por que parar aos quinze anos de uma vida medíocre?

A vida é sexo e eu ainda sou virgem.

Um comentário:

  1. Como é que você não quer que as pessoas envolvidas não leiam isso, se você acabou de postar num blog que já tem mais de 6000 visitas?!!!

    Esse texto me lembrou a mim demais quando tinha sua idade... É assim sempre?!

    Espero, desejo, e acredito, que tempos mais leves virão!!!

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