Seria sob uma
luminosidade meio fosca, meio perdida no tempo. Uma luz meio vaga.
Teria Johnny Cash ao fundo, com sua voz de consciência inacabada,
sua palavra de senilidade sincera e verdadeira. Se minha vida fosse
um filme, o roteirista não seria eu. Se minha vida fosse um filme,
não passaria nos cinemas. Seria daqueles filmes que você acha
perdido em meio a um milhão de filmes antigos, num daqueles links
que você deixa passar. Se minha vida fosse um livro, não teria
título. Uma história de uma página, cíclica. Uma história
daquelas que você abre numa página aleatória quando não tem nada
para fazer.
O dia está nublado. As
pessoas usam casacos na rua, na escola e em todos os lugares. Eu não
tenho uma casaco. Quase nunca estou com frio. O céu está lindo. É
a coisa mais branca que eu consigo ver. É lindo esse céu. O pôr do
sol é totalmente diferente do nascer dele. No nascimento, está tudo
escuro e o sol vai abrindo caminhos com os cotovelos, empurrando as
sombras para lá e para cá. Doendo nos olhos. Chorando nas praias.
Quanto mais tempo vai se passando, mais luz o sol vai lançando sobre
nós. Mais alto e imponente ele fica. No poente, está claro, e ele
vai para a escuridão, nascer em algum outro lugar do mundo. Ele só
vai. A noite aparece e permanece estática.
A câmera foca em meu
rosto. Eu ando pelos cantos dos corredores.
A professora sorri para
mim quando eu entrego o trabalho. Não é o que ela espera de mim.
Gosto de surpreender as pessoas. Eu sou muito mais do que um maluco
sentado na última cadeira da última fila. Sou muito mais do que o
maluco que foi expulso das aulas de artes. Sou muito mais do que o
maluco que disse na cara da coordenadora que a arte não tinha
utilidade nenhuma e que havia coisas muito mais importantes, mesmo
sendo, provavelmente, o maior adorador de arte daquela escola
medíocre. Eu sou muito mais do que o revoltado de cabelo bagunçado.
Existe um cara sentimental por trás das teorias sobre o universo.
As pessoas costumam chamar de “cara gay”, mas eu prefiro chamar
de “eu”.
É assim que eu sou. Eu
tenho namorada. Me orgulho muito em não me comportar como um homem
comum. Eu tento disfarçar quando olho para a bunda de uma garota.
Imagina que constrangedor! Sei lá. Os homens normais não têm bom
senso. Eu realmente não sou um homem normal. E não é questão de
sexualidade. É questão de caráter e moral.
Estou sentado no chão
com um livro de autoajuda, que não é meu, no colo. Do meu lado está
uma menina que há algumas semanas costumava ter o cabelo loiro e que
me apareceu assim, morena, depois de um longo período sem vê-la.
É a pessoa mais
educada que eu conheço. Uma vez ela estava brincando com uma garrafa
de água de plástico na mesa da cantina. A garrafa caiu com certa
força na mesa. Acredite ou não: ELA PEDIU DESCULPAS PARA A MESA!
Ela está lendo “A
dança do universo – Marcelo Gleiser ”. Ela disse que vai me
emprestar depois que acabar. Eu sentei e não falei nada. Ela também
não. EU fiquei olhando para o céu e enfatizando na minha cabeça o
quanto ele estava lindo. Eu em voz baixa. Ela falou que também
gostava quando ele ficava assim. Eu falei que estava muito branco.
Ela disse que aquilo não era branco. Eu disse que era a coisa mais
branca que eu já havia visto. Ela voltou a ler o livro. A gente
conversou sobre a irmã dela. Depois eu disse que as pessoas diriam
que eu estava gostando dela, somente por estar ali, conversando com
ela. Ela sorriu e confirmou. Eu falei sobre amigos. Ela disse que
contava nos dedos de uma mão as pessoas que poderia contar e que
quando realmente precisava, percebia que nem aquelas pessoas ela
poderia realmente contar. Ela disse para eu aprender. Acho que
aprendi.
Johnny Cash, um filho
da puta que sabe fazer os outros chorarem.
“Eu sou o cara mais
louco que vocês já conheceram” - João Neto Guimarães
Eu espero que as
pessoas não leiam isso. Pelo menos as pessoas envolvidas.
Hoje eu tirei umas
fotos. Estava precisando conversar com alguém. Precisava que alguém
perguntasse se eu estou bem. Precisava que alguém realmente
estivesse preocupado com a minha resposta. Faz uns dois dias que não
vejo a confidente/conselheira. Faz um mês que não vejo minha
melhor amiga. Liguei para quem eu ligo quando preciso e a única
pessoa que eu conto nesses dias nublados. Acho que ela está me
evitando. Eu sempre estrago as coisas. Eu sou o remédio amargo que a
criança renega.
Eu realmente precisava
falar com ela. A louca dos guturais se foi, apesar de ter deixado uma
sósia muito parecida na Noruega com a qual faz muito tempo que eu
não converso. Tudo bem. Peguei o violão e tentei algo. Deu pra
consolar os mosquitos. Assisti algumas coisas no computador. Eu
preciso passar no vestibular. Preciso ir bem no ENEM. Preciso de um
monte de coisa, mas eu nem consegui falar com minha melhor amiga. Nem
consegui conversar com alguém direito hoje. Ainda não consegui sair
dessa fase adolescente em que por tudo se faz drama. Consegui passar
das seis mil visitas no blog, mas que se foda.
O Sr. Reticente é o
cara mais fantástico que eu não conheci.
Eu tenho um romance
para terminar. Tenho que acordar às seis da manhã e tomar banho
gelado. Tenho uma porra de uma prova com 45 questões de Matemática
e suas ciências amanhã às oito. Tenho um mundo pra construir.
Vamos ver se eu consigo falar com Maria amanhã. Só falar besteira.
Ela me distrai. Vou ver se me encontro comigo. No calçadão de Ponta
Negra às sete, que tal?
Vou esperar o carnaval
chegar. Quando esse escarcéu passar. Estou me guardando para quando
o carnaval chegar. Quem me vê em minha loucura matinal acha que eu
não sei sambar. Eu ainda tenho um mundo cheio de desilusões à
minha frente, por que parar aos quinze anos de uma vida medíocre?
A vida é sexo e eu
ainda sou virgem.
Como é que você não quer que as pessoas envolvidas não leiam isso, se você acabou de postar num blog que já tem mais de 6000 visitas?!!!
ResponderExcluirEsse texto me lembrou a mim demais quando tinha sua idade... É assim sempre?!
Espero, desejo, e acredito, que tempos mais leves virão!!!