quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Pedra bruta

entra com cuidado, não pisa no tapete sem estar descalça não, tira esse peso dos ombro e coloca ali atrás do sofá. não me chama de louca na frente dos outros, olhe pra mim enquanto tô distraída te escrevendo. o sol agora brinca na janela e desliga a luz no botão. vê se me olha com carinho e para de inventar desculpas depois das duas. volta pra casa, não vale a pena perpétua um descaso assim. essa gente é tanta que deixa a rua colorida em fevereiro. você acha esse pleonasmo vicioso? esses dias aqui na Terra são tão chatos. fica aqui comigo chupando jabuticabas suicidas. as lunetas, anéis de planetas, auréolas flutuando sob a cabeceira da cama não te deixando dormir. existe um universo nos esperando quando todos forem pra casa. há flores me comendo e tudo rodopia e dói. não me perguntei sobre o demônio que canta agora ao meu ouvido, essas paredes, a chuva invadindo o chão do quarto. aqui dentro está tendo um incêndio. e eu vou diluindo como água. cavalos e búfalos e veados tocam guitarra. metamorfose diabólica. a sombra te engoliu e a sua boca está tão seca e os seus olhos tão indiferentes. eu preciso aprender a orar. vamos pra Bahia e eu quero aprender a dançar um samba e há tanta força nesses seus cabelos. esse cheiro de laranja fresca é do Norte. não precisa da letra maiúscula e me ensine inglês em seis meses. tire esse sorriso de maldade do rosto antes que as visitas cheguem. a minha boca tem gosto de sangue e saudade e tenho sede. se eu fugir de casa fica bem aí porque sei voltar. isso não é derrota, amor. tem alguém andando arrastando os pés na sala e eu sob uma onda magnética em cima da cama de solteira. eu troco gêneros e ouço vozes de outro planeta. tem café na garrafa e o cobertor é pequeno demais para dois acordarem sem frio. não há tristeza em meus olhos agora, só esse medo que canta alguma música calma demais. eu escrevo romances meus e a música recomeça pedindo para alguém entrar. entra, pode ver. nada mudou senão eu. só eu fui ontem pra natal ver se ganho o presente. vou ficar cega antes de morrer se eu não morrer antes dos trinta. é quase um pedido de desculpas toda essa coisas escritas aqui sem pudor. isso é passageiro, amanhã vai criar casca. nosso choro não será eterno pois a eternidade é cárcere e estamos no tempo da seca. o carnaval já chegou na minha rua e toda solidão tem um par. tome banho quando voltar pra casa e limpe o chão para não ficarem suas pegadas quando o mundo girar de novo. é tão ferida essa luz do sol. é tão ausente o sol agora. se disser que tenho fome de novo isso me torna repetitiva? compulsiva? há espaço em outra galáxia e dentro das minhas pernas. entra pra ver as fases da Lua em ciclo semanal. não precisava ler tudo isso se não sei escrever bons finais àquilo que inicio. há lunetas te enxergando indo embora. existem perguntas criadas sem respostas e o universo pinta e borda com a capa dos discos. eu escrevi um livro enquanto sonhava e a realidade é como a cena de um filme falido e os filmes do Lars Von Trier me dão a sensação de que já posso morrer sem precisar rimar.

Por Gyzelle Góes. 03.02.2015

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Ninguém é autossuficiente de pensamento.

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